A psicologia como aliada ao tratamento da hanseníase

Profissional e estudante da psicologia abordam como a atuação nas rotinas de tratamento da hanseníase podem aprimorar ainda mais o processo de cura dos pacientess 

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O Dia Nacional da(o) Psicóloga(o) é celebrado na data que marca a regulamentação da profissão no Brasil. O feito se concretizou no dia 27 de agosto de 1962, com a publicação da Lei nº 4.119. Desde então, a data celebra os profissionais que podem atuar nos mais diversos contextos de cuidados à saúde mental.

Uma das possibilidades de atuação do psicólogo envolve o apoio no tratamento de pessoas acometidas por diferentes doenças, incluindo a hanseníase. Luana Massotti, psicóloga com 11 anos de experiência profissional, teve seu primeiro contato com esse eixo no Hospital Santa Marcelina, unidade de referência em tratamento da hanseníase em Rondônia, onde trabalhava com a demanda de reabilitação física de pacientes atingidos pela enfermidade.

Em suas atividades, Luana pôde identificar uma demanda reprimida de atendimento psicológico para aqueles pacientes. “A princípio eu não tinha uma ligação tão direta com a hanseníase, mas a cada atendimento que eu fazia eu via uma demanda muito grande, com possibilidades de atuação. Então, eu comecei a me colocar à disposição para fazer atendimento das pessoas acometidas pela doença que estavam em tratamento no hospital”, ela relembra.

A demanda revelada por Luana surge de um contexto de estigmatização da hanseníase que afeta intensamente a saúde mental das pessoas atingidas pela enfermidade. Além de lidar com as questões de aspectos físicos como reações e possíveis sequelas da doença, até 50% desse grupo está sujeito a enfrentar depressão, transtornos de ansiedade e tentativas de suicídio, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Projetos Transformadores

Luana Massotti também foi voluntária dos Grupos de Autocuidado (GACs) apoiados pela NHR Brasil em Porto Velho. A atividade conta com a gestão de uma equipe multiprofissional e proporcionava um espaço seguro para a troca de vivências entre os participantes do grupo.
A psicóloga destaca sua experiência na gestão do GAC e suas atuações iniciais no auxílio no tratamento da hanseníase a fez perceber que a abordagem de profissionais da psicologia deve partir de uma escuta ativa e de um cuidado associado.

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Ela frisa que um equipamento de saúde preparado para envolver o paciente em seu tratamento, promovendo autonomia e empoderamento do indivíduo, possibilita que o serviço psicológico encontre um caminho com menos resistência para o acompanhamento do bem estar mental daqueles que precisam. Afinal, essa abordagem permite um entendimento maior do paciente acerca de suas necessidades, desenvolvendo assim uma mudança de atitude diante desse aspecto do autocuidado, o que, para muitos, ainda pode parecer intimidador.

Entenda mais sobre os Grupos de Autocuidado (GACs) clicando aqui.

De Paciente a Profissional

Tiago Paradela, estudante de psicologia e conselheiro da NHR Brasil, passou por esse processo de compreender a necessidade do acompanhamento psicológico em sua jornada como indivíduo acometido pela hanseníase. Ele foi diagnosticado com a doença em 2009, e admite que, desde o início do tratamento, tinha certo receio em procurar ajuda psicológica.

“Eu era muito novo quando fui diagnosticado, estava com 17 para 18 anos. E nesse momento vem um processo de luto. Você é diagnosticado com uma doença que vai mudar radicalmente a sua vida. Eu tinha objetivos e, quando veio o diagnóstico de hanseníase, eles foram por água abaixo”, relata Tiago.

Ele explica ainda que esses sentimentos foram um dos motivos que o fizeram abandonar o tratamento por certo período de tempo, retornando para concluí-lo em 2017 e, desta vez, sendo acompanhado pela psicóloga do centro de referência onde vivia. Ainda assim, não foi tão fácil para Tiago aceitar que sua saúde mental precisava ser colocada como prioridade naquele momento, mas a assistência e a cautela da profissional que o acompanhava fizeram toda a diferença.

“Eu não percebia que estava doente psicologicamente. Porém, aos poucos, a psicóloga foi se aproximando e vendo que eu necessitava de fato desse cuidado. Ela conseguiu primeiro minha confiança e depois eu vi que estava bem debilitado, em um processo depressivo profundo e não tinha percebido ainda”, conta ele.

Hoje em dia, Tiago é coordenador do Grupo de Autocuidado em Hanseníase do Hospital Santa Marcelina e está prestes a concluir sua graduação em psicologia. Suas vivências até então o fazem destacar que é indispensável que haja uma abordagem mais cuidadosa com o paciente diagnosticado com a enfermidade. Ele adiciona ainda que o profissional deve conhecer o histórico da pessoa acometida, para ter a melhor abordagem possível. 

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Por toda sua experiência, Tiago tem como objetivo principal, após se formar, levar o atendimento psicológico para famílias atingidas pela hanseníase que se encontram impossibilitadas de serem observadas pelas unidades de referência, por motivo de vulnerabilidade socioeconômica.

“A psicologia vem a somar em todos os âmbitos onde o ser humano está inserido. E existem campos onde a abordagem psicológica é de extrema necessidade, como nesse contexto de casos de adoecimentos severos que a hanseníase provoca. Meu objetivo é continuar trabalhando no campo da hanseníase e poder levar o acompanhamento e acolhimento para essas pessoas”, conclui ele.

Psicologia como Estratégia

Ainda há relativa escassez de informações mais precisas que possibilitem um entendimento da relação entre o adoecimento pela hanseníase e o desenvolvimento de condições psicológicas. Tendo em vista essa realidade, a NHR Brasil visa promover projetos de pesquisas que estudem os impactos da doença no bem estar das pessoas acometidas, além de ações integrativas que favoreçam o cuidado integral, incluindo a saúde mental.

Alexandre Menezes, diretor da NHR Brasil, explica que essa estratégia faz parte do plano da organização para os próximos 4 anos, destacando a importância da participação do profissional da psicologia para o andamento dessas ações.

“É fundamental que o profissional psicólogo esteja presente nesse processo, tanto no desenvolvimento da abordagem da pesquisa, para podermos definir claramente o método, como também para uma análise mais precisa dessas informações que serão coletadas”, ressalta ele.

Quanto às práticas integrativas, Alexandre cita a acupuntura e a aromaterapia como exemplos de atividades que serão implementadas nos programas da organização. “São abordagens que não são farmacológicas nem medicamentosas, mas que já possuem estudos que comprovam seus efeitos no bem-estar mental e físico daqueles que utilizam as medidas, dentro de uma abordagem mais ampla de tratamento”, salienta.

“Nós pretendemos iniciar esse projeto o quanto antes, devido a urgência dessa lacuna que consideramos tão relevante. A abordagem do bem-estar mental de forma mais qualificada, estruturada e estabelecida a partir de uma metodologia bem definida é o que buscamos conquistar junto com os parceiros psicólogos dos municípios e estados em que atuamos”, frisa Alexandre.