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Miguel tinha oito anos quando surgiu a primeira mancha no rosto e teve um caminho demorado até iniciar o tratamento. (Imagens: Gui Christ)

Para a mãe, parecia o efeito de uma pancada. Para o primeiro médico procurado, uma lesão que seria removida pelo uso de pomadas. Vizinhos e amigos chegavam recomendando produtos anti-inflamatórios e bactericidas. A mancha roxa no rosto de Miguel Vitor dos Santos apareceu quando ele tinha oito anos. Ela crescia e ficava mais evidente com o passar do tempo. O menino estava com 12 anos quando, enfim, começou a ser tratado.

Mas até que o diagnóstico fosse confirmado, apareceu uma segunda mancha, desta vez na orelha. Foi na terceira procura por ajuda médica que a palavra “hanseníase” apareceu pela primeira vez. “A dermatologista viu a mancha no rosto e na orelha e já disse que era hanseníase. Ela passou uma baciloscopia depois. A demora foi aí”, relembra a mãe Joseane dos Santos, 35.

Na cidade de Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife, Joseane conta ter tido dificuldade de acesso ao exame na rede pública. Com isso, o caso de Miguel ficou parado por mais um ano. Enquanto isso, ela tentou remediar com as dicas que recebia de amigos. E teve dúvidas: o filho estaria mesmo com hanseníase, visto que continuava com a sensibilidade normal nos locais das manchas?

Como nenhum remédio resolvia, ela aproveitou a chegada de uma nova profissional ao posto de saúde mais próximo para tentar de novo. “Ele já estava com manchas na perna também. Ela fez os testes pra ver se ele sentia quente ou frio, mas nesses lugares da perna ele não sentia. Ela teve certeza, mas não podia fechar o caso e me deu endereços de três lugares onde a gente poderia ir”, conta Joseane.

 

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Dentre as opções, ela considerou mais fácil ir ao Hospital Otávio de Freitas, em Recife. Na unidade, Miguel foi atendido e diagnosticado. O tratamento foi iniciado na unidade, com orientações para a continuação no posto de saúde próximo à casa deles durante um ano.

Na direção certa

Após tanta demora em iniciar o tratamento, Miguel teve a sorte de contar com uma equipe multiprofissional. Na unidade em Recife, ele teve sessões de terapia ocupacional durante dois meses. Isto porque a mão já apresentava uma leve atrofia, um dos sinais de que a doença havia atingido o funcionamento dos nervos. Com exercícios para a mão, foi possível reverter.

Ele e a mãe foram convidados a participar do grupo de autocuidado do Hospital Otávio de Freitas, coordenado por Fabiana Amorim, terapeuta ocupacional da unidade. O grupo é apoiado pela NHR Brasil, promovendo conscientização sobre o autocuidado e atividades lúdicas para pessoas acometidas e familiares. “Quando eles faziam passeios, eu gostava de levar o Miguel porque ele se distraía. Porque às vezes ele ficava meio irritado”, partilha Joseane.

Durante o tratamento, a mãe percebeu em Miguel uma irritação que ela considerava excessiva e uma dificuldade em se divertir nas brincadeiras com os irmãos e colegas. “Antes ele era alegre, brincava. Sempre foi meio zangadinho, mas não como ele ficou”, compara.

Foi quando ele contou com atendimento psicológico por dois meses na unidade em Recife. No período, houve uma melhora no comportamento. Mas Joseane viu o filho voltar ao temperamento de antes quando conluiu o tratamento, em julho de 2019. “Eu acho que ele ficava mais irritado mesmo era por precisar tomar os remédios todo dia. Ele sempre reclamava na hora, eu tive muito trabalho com isso”, conta.

 

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Miguel diz estar feliz por ver a mancha no rosto menos evidente do que antes. Entre vizinhos e colegas, as perguntas sobre isso começaram há muito tempo, quando a mancha surgiu pela primeira vez. Ainda no tratamento, a reação das pessoas incomodou o menino. “Os outros pensavam que eu tinha levado um murro na cara, ficavam todo tempo perguntando isso. Eu antes ficava dizendo que era pré-diabete, porque a gente pensava que era isso. Mas hoje eu digo que é hanseníase”, relata.

Hoje, Miguel tem 13 anos e está curado da hanseníase após um ano de tratamento. “Ele agora brinca normalmente, ele está como era antes”, comemora Joseane.